O drama, o humor e o terror andam discretamente de mãos dadas na conturbada vida familiar do menino Francie Brady, de apenas 12 anos de idade. Uma história chocante, metafórica e espiritual.
O filme do diretor Neil Jordan surpreende já nos créditos iniciais, ao som de “Mack The Knife“, dos irmãos Santo & Johnny, o nome dos envolvidos aparecem na tela enquanto, no plano de fundo, várias cenas ilustradas com traços de histórias em quadrinhos vão desfilando, vemos um olho arregalado, assustado e o letreiro do filme escrito em um misto de fonte, em seguida na tela cowboys, super-heróis, nave espacial, soldados e máquinas em campo de guerra e finaliza na transição no personagem principal deitado em um leito, enfaixado do cocuruto ao dedão do pé, na companhia de dois adultos, sendo um deles chorando e lamentando a situação e tudo o que antecedeu desde então.
O personagem principal, Francie Brady, é também o narrador da sua história de infância. A pequena cidade rural irlandesa, em plena década de 60, é cenário da história de um menino com seus 12 anos de idade, que em meio as brincadeiras com Joe Purcell, seu melhor amigos, o garoto se vê em uma vida conturbada, sobrevivendo ao lado do pai alcoólatra e da mãe à beira da insanidade que vivem saindo aos berros e tapas.
Era inevitável que no ambiente nada familiar em que Francie convivia – toda a balbúrdia e violência explícita – iria refletir e bagunçar o seu comportamento. Esse caminho para o caos é criado de maneira impecável pelo diretor Neil Jordan, o seu roteiro – adaptado do livro homônimo escrito por Patrick McCabe – possui uma fluidez concisa e cheia de vida, por mais paradoxo que pareça.
Os atores interpretam muito bem os seus papeis, principalmente o jovem protagonista Eamonn Owens, parece que o personagem nos engana o tempo todo, suas peripécias vão se tornando cada vez mais intensas e agressivas, assim como a sua busca por vingança em cima da Sr.ª Nugent, esta é o estopim para que uma “bomba” caia sobre a pacata cidade, um acumulo de revolta sobre as vezes que a família Brady foi chamada e tratada como uma vara de porcos pela Sr.ª Nogenta, aliás, Nugent.
É interessante ver quando o narrador da história troca algumas poucas palavras com o personagem, uma vez que ambos são as mesmas pessoas, isso traz ao filme uma dose maior de loucura. A imaginação de Francie vai longe, nota-se que ele pratica as suas insanidades de maneira como se estivesse brincando dentro de um mundo de faz de conta, fantasioso.
A trilha sonora é deliciosa e transita em plena sintonia com as cenas. O filme encerra com a canção “Where Are you?”, de Frank Sinatra, música que tem na letra o sentimento de abandono de um amor, para o filme a letra pode expressar o sentimento de Francie quanto aos seus pais, de uma maneira indireta podemos dizer que eles abandonaram o amor do filho, e como herança deixaram uma mancha escura e eterna na alma do pequeno.
Apesar do filme ter a sua dose de humor negro, foram raros os momentos em que me esforcei para soltar um riso mínimo, aquele que nasce e morre no canto da boca. O drama e o surrealismo me pegaram pelo colarinho. Ao mesmo tempo que assistimos a performance evolutiva de um anjo maquiavélico, vale lembrar que no filme é possível notar traços críticos sobre várias questões como pedofilia.
Nas cenas em que a Nossa Senhora aparece para Francie, percebemos que por trás de toda a escuridão, que quase toma o coração do pobre garoto, há uma fresta de luz e esperança tão forte que o ajuda a atravessar a estrada escura e fria da qual ele caminha. Na última conversa com Nossa Senhora, Francie, agora adulto e curado, questiona se todas as coisas bonitas acabaram, na sequência Ela responde que não, que as coisas bonitas ainda estão todas aí e joga uma pequena flor (fura-neve) como uma amostra da beleza, então Francie pega e olha a florzinha e faz o sinal da cruz.
Eu vejo uma clara metáfora quanto a escolha de Nossa Senhora pela flor fura-neve, foi uma forma de mostrar que há beleza mesmo em lugares quase inóspitos, talvez esse lugar esteja relacionado com o coração que Francie tinha quanto criança.
É realmente um filme que nos faz mergulhar em diversos sentimentos, da tragédia à busca de redenção divina que no final chega a dar um nó na garganta. Só quando fiquei sabendo do filme “The Butcher Boy“, soube que sua origem vem das páginas de um livro, por tudo que eu assisti nesta adaptação – pela qualidade da produção – não tenho dúvida que o livro tem a qualidade do filme, no mínimo.
NOTA:
Trailer
Pôster
Curiosidades sobre Nó na Garganta
Stephen Rea é creditado no filme apenas pelo papel de Pa, mas também interpreta o papel de Francie adulta, que narra a sua história em voz-off ao longo do filme, sem créditos;
Segundo consta, Eamonn O’Shea foi para a sua audição e perguntou se o ator que o tinha precedido era melhor e, se fosse, não valia a pena ler o seu monólogo preparado;
O papel principal foi originalmente dado ao ator mirim Byron Hayes. A produção foi interrompida para que Neil Jordan pudesse fazer “Michael Collins: O Preço da Liberdade” (1996) em seu lugar. Quando a produção foi retomada, Byron Hayes já estava velho demais para o papel;
Estreia de Eamonn Owens no cinema;
O autor do romance original, Pat McCabe, fez algumas tentativas de escrever uma adaptação de seu livro para a tela, que se afastou um pouco mais de seu livro do que do filme. Neil Jordan, co-roteirista e diretor do roteiro, aproximou-o do romance original;
Último filme da The Geffen Film Company (distribuidora e produtora de filmes americana fundada por David Geffen, fundador da Geffen Records e futuro co-fundador da DreamWorks);
Neil Jordan disse ao The Irish Independent que ele havia pensado em “escalar” Marilyn Monroe como a Virgem Maria por meio da tecnologia usada em “Forrest Gump: O Contador de Histórias” (1994), mas desistiu da ideia quando percebeu que seria muito caro;
Grande parte do filme foi filmada em Clones, no condado de Monaghan, cidade natal de Pat McCabe, autor do romance original e coautor do roteiro, que também faz uma breve aparição no filme como Jimmy the Skite;
Incluído entre os “1001 filmes que você deve ver antes de morrer”, editado por Steven Schneider;
O último longa-metragem de Sinéad O’Connor;
Brendan Gleeson, Ian Hart e Fiona Shaw apareceriam mais tarde nos vários filmes da franquia “Harry Potter”;
O filme reúne o diretor Neil Jordan com muitos atores que apareceram em seu filme anterior, “Michael Collins: O Preço da Liberdade”: Stephen Rea, Ian Hart, Jer O’Leary, Brendan Gleeson, Sean McGinley, Gerard McSorley, Stuart Graham, Aisling O’Sullivan, Paraic Breathnach e Vinnie McCabe; Sinéad O’Connor atua nesse filme e forneceu músicas para a trilha sonora de ‘Collins’.
Ficha Técnica
Diretor: Neil Jordan.
Roteiro: Neil Jordan e Pat McCabe.
Produtores: Neil Jordan, Redmond Morris e Stephen Woolley..
Diretor de fotografia: Adrian Biddle.
Editor: Tony Lawson.
Design de produção: Anthony Pratt.
Figurino: Sandy Powell.
Cabelo e maquiagem: Eileen Buggy, Fiona Connon, Dee Corcoran, Sandra Kelly, Morag Ross, Denise Watson e Matthew Smith.
Música: Elliot Goldenthal.
Elenco: Eamonn Owens, Sean McGinley, Peter Gowen, Alan Boyle, Andrew Fullerton, Fiona Shaw, Aisling O’Sullivan, Stephen Rea, John Kavanagh, Rosaleen Linehan, Anita Reeves, Gina Moxley, Niall Buggy, Ian Hart, Anne O’Neill, Joe Pilkington, Pat McGrath, Jer O’Leary, Pat Leavy, Janet Moran, Paraic Breathnach, John Olohan, Ardal O’Hanlon, Mikel Murfi, Brendan Conroy, Tom Hickey, Brendan Gleeson, Gregg Fitzgerald, John Finegan, Gavin Kelty, Eoin Chaney, Milo O’Shea, Sinéad O’Connor, Ciaran Owens, Shane O’Connor, Paolo Tullio, Siobhan McElvaney, Áine McEneaney, Pat McCabe, Sean Hughes, Tony Rohr, Birdy Sweeney, Marie Mullen, Stuart Graham, Macdara Ó Fátharta, Ronan Wilmot, Vinnie McCabe, Dermot Healy, Gerard McSorley, Niamh Duffy e Richard Purcell.
O novo filme produzido pela Netflix, The Old Guard, tem direção de Gina Prince-Bythewood e é uma adaptação da aclamada história em quadrinho homônima criada…
Este site usa cookies para que possamos oferecer a melhor experiência de usuário possível. As informações de cookies são armazenadas em seu navegador e executam funções como reconhecê-lo quando você retorna ao nosso site e ajudar nossa equipe a entender quais seções do site você considera mais interessantes e úteis.
Cookies estritamente necessários
A configuração "cookies estritamente necessários" deve estar ativada o tempo todo para que possamos salvar suas preferências de configuração de cookies. Você não pode desabilitar essa opção, mas poderá customizar as configurações de outros cookies terceiros.
Se você desativar este cookie, não poderemos salvar suas preferências. Isso significa que toda vez que você visitar este site, precisará habilitar ou desabilitar os cookies novamente.
Cookies de terceiros
Este site usa o Google Analytics para coletar informações anônimas, como o número de visitantes do site e as páginas mais populares. Manter este cookie habilitado nos ajuda a melhorar nosso site.
Habilite os cookies estritamente necessários primeiro para que possamos salvar suas preferências!
Cookies de Anúncios
Usamos o pixel do Facebook/Instagram, LinkedIn, Pinterest, Google/Youtube e TikTok neste site. Manter essa configuração fará com que possamos veicular anúncios customizados de acordo com sua preferência.
Habilite os cookies estritamente necessários primeiro para que possamos salvar suas preferências!
Políticas gerais
Confira nossas políticas gerais de privacidade e entenda como funciona a atuação do nosso site para preservar sua privacidade com a máxima transparência. Clique aqui para acessar agora!
Oiii, gostei bastante viu? Posta mais, vou acompanhar, beijo!
Olá. Fico lisonjeado. Que bom que gosta das postagens. Irei postar mais, em breve. Beijos.