O filme “Homens e Deuses” mostra um pouco da vida dos monges trapistas sobre uma história baseada em fatos reais que demonstrou o quanto eles são fieis e amorosos aos seus princípios e propósitos.
A primeira vez que ouvi falar sobre a existência do filme “Homens e Deuses” (Des Hommes et des Dieux, 2010), foi após 10 anos do seu lançamento, há poucos dias, quando eu assistia um vídeo, uma entrevista, com o abade Dom Bernardo Bonowitz, do Mosteiro Trapista Nossa Senhora do Novo Mundo – o único mosteiro da ordem trapista no Brasil, localizado no município de Campo do Tenente, no estado do Paraná. O monge nascido em Nova Iorque, de família judaica – convertido ao catolicismo quando jovem – foi o porta-voz e responsável pela propaganda do filme francês em terras brasileiras.
A trama conta a história verídica do massacre dos monges trapistas, em Tibhirine, na Argélia, no ano de 1996. Na ocasião, o país norte-africano estava sob guerra civil, ao lado do mosteiro instalava-se uma vila muçulmana, havia um convívio harmonioso entre o povoado e os monges, um ambiente até então de tranquilidade. No entanto, um grupo de jihadistas assassinam operários croatas, daí em diante é tudo uma questão de tempo até que o mosteiro seja invadido.
O diretor Xavier Beauvois mantém o foco apontado para o meio, o caminho, mais do que para o desfecho, o final impiedoso. Acompanhamos toda a rotina dos monges no mosteiro, a devoção ao alicerce baseado na oração constante e no trabalho manual. Eles ainda ajudam as pessoas da vila muçulmana com consultas médicas, doações de remédios, calçados e mantimentos.
Quanto ao desenvolvimento do filme, ele caminha a passos curtos, assim como caminham os monges, mas nada que nos leve à apatia, muito pelo contrário, a fluidez do roteiro vai contra ao silêncio pregado pelos trapistas. Destaque para a fotografia de Caroline Champetier, a francesa entrega composições de sombra e luz incríveis e destaca muito bem a natureza exterior.
São vários o momentos de destaque, mas enfatizo os diálogos quando todos encontram-se em comunhão na mesma cena. Na primeira conversa que reúne todos os monges em volta da mesa, após Christian (Lambert Wilson) ter decidido por todos abrir mão da proteção militar do governo, assistimos ao questionamento do descumprimento de um princípio da vida cenobítica, de viver em comunidade: o de decidir sozinho algo que afetará a vida de todos.
Já na conversa posterior, onde todos se reúnem à mesa, coloca-se em pauta a questão de quem irá ficar para enfrentar a eminente ameaça à vida. Daí surgem opiniões divergentes quanto enfrentar a morte ou abandonar o rebanho, há ainda muita indecisão. Nesse intervalo à reunião seguinte, há um diálogo entre os monges Christian (Lambert Wilson) e Christophe (Olivier Rabourdin), em que o último questiona a sua fé, o seu propósito de entregar a própria vida para seguir a de Cristo. Então, Christian o seu irmão pelos braços e o faz lembrar que o amor é a eterna esperança, que o amor suporta tudo.
A prova de que todos os monges estão decididos e dispostos a ficar no mosteiro e enfrentar a morte por Cristo, com Cristo e em Cristo, nos é mostrada divinamente na cena em que Luc (Michael Lonsdale) caminha lentamente rumo ao aparelho de som para tocar “O Lago dos Cisnes”, de Tchaikovsky. Em seguida, com duas garrafas de vinho na mão, se junta à mesa com seus irmãos monges e na sequência a câmera de Xavier Beauvois percorrer as diversas expressões faciais dos homens reunidos à mesa. Seria uma metáfora à Última Ceia? Tanto a cena seguinte quanto o título “Homens e Deuses” referenciam os versículos 6 e 7 do Salmo 81, apresentados no início do filme.
NOTA:
Trailer
Poster
Curiosidades sobre Homens e Deuses
Depois que o roteiro foi concluído, ele foi enviado aos familiares dos monges para receber sua aprovação;
A apresentação oficial francesa para o Prêmio de Melhor Filme Internacional na 83ª edição do Oscar;
A maior parte da produção foi filmada em um mosteiro abandonado em Azrou, Marrocos;
Ao pesquisar o roteiro, o diretor Xavier Beauvois passou seis dias vivendo na Abadia de Tamie, em Savoie. Todos os atores também tiveram que fazer o mesmo;
Os atores treinaram durante um mês com François Polgar, ex-diretor assistente do coral da Ópera de Paris. Isso os ajudou a soar mais autênticos quando se tratava de cantar cantos gregorianos e cistercienses. Dos atores, apenas Lambert Wilson tinha alguma experiência anterior em canto, tendo se apresentado em vários shows individuais;
Quando o filme foi lançado no Reino Unido, só foi exibido em 16 salas de cinema. Mesmo assim, conseguiu entrar na lista dos 15 melhores filmes da semana;
Incluído entre os “1001 filmes que você deve ver antes de morrer”, editado por Steven Schneider;
Com 11 indicações, esse filme recebeu o maior número de indicações ao César em 2010;
Em uma cena do filme “Como Eu Era Antes de Você” (2016), estrelado por Emilia Clarke, o casal de protagonistas assistem e falam sobre “Homens e Deuses”;
Permaneceu no topo das paradas de bilheteria francesas por quatro semanas consecutivas;
Segundo filme de Xavier Beauvois a estrear no Festival de Cannes. Seu filme de 1995, “Não Se Esqueça que Você Vai Morrer”, também foi exibido no festival;
Os monges de Tibhirine foram sequestrados no final de março de 1996 e encontrados mortos dois meses depois. Até hoje, ninguém sabe realmente quem foi o responsável por seus assassinatos. Embora o Grupo Islâmico Armado tenha sido o capturador, nos últimos anos eles alegaram que o exército argelino matou os monges acidentalmente. Os prisioneiros foram todos decapitados e seus corpos nunca foram descobertos. Seus restos mortais estão enterrados no pátio da igreja do mosteiro;
O produtor Etienne Comar teve a ideia do filme quando o 10º aniversário dos assassinatos estava sendo comentado na mídia francesa.
Ficha Técnica
Diretor: Xavier Beauvois.
Roteiro: Xavier Beauvois e Etienne Comar.
Produtores: Martine Cassinelli, Pascal Caucheteux, Etienne Comar, Jean-David Lefebvre, Frantz Richard e Grégoire Sorlat.
Diretores de fotografia: Caroline Champetier.
Editor: Marie-Julie Maille.
Design de produção: Michel Barthélémy.
Figurino: Marielle Robaut.
Cabelo e maquiagem: Franck Limon-Duparcmeur e Pierre Olivier Persin.
Música: Mike Kourtzer.
Elenco: Lambert Wilson, Michael Lonsdale, Olivier Rabourdin, Philippe Laudenbach, Jacques Herlin, Loïc Pichon, Xavier Maly, Jean-Marie Frin, Abdelhafid Metalsi, Sabrina Ouazani, Abdellah Moundy, Olivier Perrier, Farid Larbi, Adel Bencherif, Benaïssa Ahaouari, Idriss Karimi, Abdellah Chakiri, Goran Kostic, Stanislas Stanic, Arben Bajraktaraj, Zhour Laamri, Fatima Herandi Raouya, Farid Bouslam, Fadia Assal, Maria Bouslam, Soukaïna Bouslam, Rabii Ben Johail, Saïd Naciri, Hamid Aboutaieb e El Alaoui El Hassan.
O novo filme produzido pela Netflix, The Old Guard, tem direção de Gina Prince-Bythewood e é uma adaptação da aclamada história em quadrinho homônima criada…
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